domingo, 24 de agosto de 2008

A Estrada vai além do que se vê...



“Nós entendemos que você tem dúvidas se deve servir na obra de Deus ou trabalhar como ativista político. Nós humildemente sugerimos que você pode fazer as duas coisas.”. – Frase dita a Wilberforce durante um jantar em sua casa, na companhia de amigos. Talvez não haja nada melhor para defini-lo, por isso o apresentarei a vocês agora, para que compreendam o motivo:

William Wilberforce ficou órfão de pai muito cedo, sendo levado a morar com os tios, porquanto sua família não tivesse recursos. Nessa casa, foi muito influenciado pelo evangelho, através de fervorosas pregações de John Newton, antigo capitão de navio negreiro, que se converteu, tornando-se um grande pregador. Mais tarde William escreveria sobre o quanto admirava Newton; estimava-o como um pai.

A casa dos tios serviu a Wilberforce como um seminário, tanto que sua mãe, preocupada que seu filho se tornasse um fanático, tirou-o de lá e o matriculou em um internato, e em seguida na Universidade de Cambridge, na tentativa de lhe devolver à Razão. Em Cambridge, se tornou amigo inseparável de William Pitt, mais tarde Primeiro Ministro da Inglaterra com apenas 24 anos. Os dois se tornaram notórios companheiros de farras, apostas e festas promovidas pela elite inglesa, regadas sempre a muitas bebidas e companhias femininas.

Wilberforce, que desde cedo demonstrava forte interesse pela política, ingressou para a Casa dos Comuns em 1780, com apenas vinte e um anos. Em uma viagem ao sul da França, William começou a ler um livro devocional e trechos do Novo Testamento em grego. Durante esse tempo, experimentou grande convicção de seus pecados, arrependendo-se do modo de vida que tinha: experimentou um reavivamento pessoal.

Ao retornar às suas atividades, seus colegas estranharam seu comportamento, pois abandonara as práticas antigas e declarava-se, abertamente, cristão. Após radical conversão, cogitou abandonar a carreira política e se tornar ministro do evangelho em tempo integral. Nesse tempo, todavia, Wilberforce procurou seu velho amigo pregador, John Newton, que o aconselhou a permanecer na política, pois acreditava ter Deus chamado Wilberforce para um propósito singular.

Durante esse tempo, o jovem inglês tomou conhecimento das condições de vida suportadas pelos negros nos navios negreiros. Na época, essas pessoas sofriam graves abusos físicos e sobreviviam em condições subumanas. Profundamente sensibilizado com os fatos, seu espírito inconformado propôs ao Parlamento um projeto de lei para abolir o tráfico de escravos. No entanto, as forças políticas conservadoras agruparam os possíveis apoios e derrubaram seu projeto.

Isso não foi o suficiente para fazê-lo esmorecer.

Wilberforce perseverou na campanha para mudar a legislação, apesar dos sacrifícios pessoais que a empreitada envolvia. Sofreu agressão física e ameaças de morte, diversas vezes. O famoso reformador John Wesley, já aos 87 anos, escreveu ao jovem William o que possivelmente seria a última carta de sua vida, na qual o encorajava a continuar lutando contra a escravidão, como forma de servir a Deus.

Ao longo de 30 anos, seu projeto de lei foi rejeitado no parlamento 20 vezes; até que em 1807, o Parlamento decidiu aprovar a lei da abolição. Após a declaração do resultado da votação, Wilberforce foi aplaudido de pé por seus companheiros, embora na época o ato de aplaudir fosse proibido no Parlamento.

Outras histórias contam que William ficou profundamente comovido ao ver o resultado do empenho de toda uma carreira, de tal forma que chorou copiosamente. Depois de mais de 16 anos de luta, finalmente testemunhou a abolição da escravidão nas colônias britânicas em 1833, e morreu três dias depois.

A vida de Wilberforce teve um impacto na sociedade porque ele entendeu que foi chamado não apenas para ocupar cargos e liderar ministérios, mas para ser sal e luz no mundo. A obra regeneradora do Espírito Santo produziu em Wilberforce sede de justiça, e a partir daí, a defesa dos injustiçados se tornou não apenas sua profissão, mas sua missão como cristão. Sua vida e seu exemplo nos desafiam a ser não apenas espectadores da história, nem meros observadores das injustiças, mas pessoas que se engajam e procuram mudar a realidade.

John Newton é o compositor do famoso hino Amazing Grace: “A maravilhosa graça de Jesus salvou um infeliz como eu. Eu era cego, e ele deu-me luz, perdido e me achou.”

Lívia Medeiros

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