sábado, 31 de maio de 2008

Sobre o Tempo


Um dos assuntos mais recorrentes e que causa muita perplexidade nos dias atuais é a maneira como lidamos com o tempo. A cada dia tem-se a impressão de que tudo passa mais rápido. E a falta de tempo é uma reclamação constante. Durante toda história, sociedades diversas tiveram noções diferentes do tempo. Isso quer dizer que a maneira como se relaciona com o passado, o presente e o futuro é específica de cada época. Dessa forma, o tempo, sendo um patrimônio que nunca recuperamos, nem sempre foi escasso como parece ser nos dias atuais.

No desenvolvimento da sociedade, passamos de uma concepção do tempo que era dominado pela natureza, em seguida, de um tempo dominado pelos seres humanos; e hoje vivemos em condições em que somos dominados pelo tempo. Essas transformações estão vinculadas às mudanças realizadas através do trabalho humano, entendido como atividade produtiva. Por meio dessa atividade, a sociedade sujeitou e moldou a natureza. Contudo, o trabalho foi quantificado através do salário e medido por meio do cronômetro e, assim, passou a ser controlado, em busca de uma maior produtividade. Portanto, é produtivo quem consegue fazer mais em menos tempo: esse é o modo com se passa a ser dominado pelo tempo, tendo a necessidade de viver em função de relógios, calendários e agendas para produzir cada vez mais.

Os jovens de hoje têm ainda uma maneira peculiar de relacionar com o tempo, pois para nós a vida parece ser mais dinâmica e diversificada. A imensa velocidade com que comunicamos e temos acesso à informação – devido à internet, celulares, etc –, e a velocidade com que vemos produtos e tecnologias surgindo e sendo ultrapassadas nos deixou “mal acostumados”: queremos que tudo aconteça para ontem. Temos pressa em arrumar um emprego, urgência em adquirir um bem, precipitação em arrumar uma namorada e, assim, essa avidez se estende para todas as decisões e relacionamentos mantidos pelos jovens. Nisso, corremos o grande risco de vivermos de maneira superficial, além de tomarmos decisões erradas. Atualmente o que mais importa é a vida agora, o momento. Percebe-se um apego ao tempo presente e às recompensas de curto prazo, sem se dar a devida importância ao cultivo de sentimentos, valores e sonhos que dão o sentido à vida e trazem resultados permanentes.

Diante da atual situação, como se relacionar com esse elemento chamado tempo? As respostas mais apressadas indicariam o dever de organizar a vida para melhor gerenciá-la, pois todos nós temos as mesmas 24 horas diárias. Uma resposta mais profunda, todavia, indicaria que devemos sempre considerar o que é mais importante, não o mais urgente.

Ainda assim, tais respostas não resolveriam a essência da questão, que envolveria desde nossas atividades mais simples até nossas concepções de mundo.

No Salmo 90, considerado o mais antigo da Bíblia, existem algumas reflexões fundamentais para compreendermos melhor a nossa relação com o tempo. Esse salmo escrito por Moisés discorre sobre a eternidade de Deus e a transitoriedade do homem. Deus está acima dos tempos, Ele é Eterno e apenas Ele é atemporal e ilimitado, enquanto nós seres humanos, ao contrário, somos apegados ao agora, com a vida passageira de características finitas e limitadas. Somente a justa medida do tempo dará o justo conhecimento dos caminhos da vida. Dessa forma, somente o relacionamento com Aquele que está acima do tempo pode orientar qual a melhor medida desse, para uma boa compreensão da natureza da vida.

Diante de tantas decisões a tomar, de caminhos a seguir, de planos a realizar, em que devemos aplicar o nosso tempo? Moisés pede a direção de Deus, dizendo: ensina-nos a contar os nossos dias, para que alcancemos coração sábio (SL 90:12). Acredito que contar os dias não seja apenas enumerá-los num calendário e amontoá-los em anos, pelo contrário, é aprender com a experiência, compreender o tempo de forma plena, gozar a vida de maneira correta e cultivar um coração que saiba tomar as melhores decisões e isso só é possível com a direção daquele que é Eterno.

Eliéser Ribeiro


"A Persistência da Memória", Salvador Dali (24X33 cm) - 1931

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